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Sessão de Poesia - Deus como interrogação na poesia portuguesa



 Pedro Miranda e David Ramos


















Sessão de poesia – Deus como interrogação na poesia portuguesa

David Ramos é um jovem vilarealense, com uma já significativa intervenção cultural no espaço público que o leva a alguns dos palcos mais carismáticos do país, como o Hard Club, onde marcará presença muito em breve. Estudante do terceiro ano de Direito, ele conjuga a proximidade e informalidade que esperaríamos encontrar num rapper, com a amabilidade e delicadeza de um gentleman. Sincronizado, sintonizando razão e emoção em cada palavra pronunciada, excelente diseur, David Ramos foi o nosso convidado para a sessão de poesia da passada quinta-feira, 1 de Março, ao fim da tarde, partindo da antologia “Verbo. Deus como interrogação na poesia portuguesa” (Assírio e Alvim, 2014), organizada por Pedro Mexia e José Tolentino de Mendonça. Conquanto a aproximação ao que de maior nada se pode pensar (Anselmo), ao que excede definições e conceitos, e convoque a necessidade de analogia, assim a unidade lectiva, no dobrar do terceiro ciclo a meses do Secundário, que se refere àquele mistério que Agostinho, nAs Confissões, chamou “mais íntimo que o meu próprio íntimo e mais sublime do que o ápice do meu ser”, demandasse também a mais densa interrogação poética. Em interdisciplinariedade, buscou-se, ainda, reforçar, nos alunos – que vieram também ao anfiteatro dizer poemas, com o mesmo pano de fundo temático, de dois autores transmontanos, diríamos como que vilarealenses de nascimento e adopção, José Augusto Mourão e A.M.Pires Cabral, respectivamente – a capacidade de encontro e aproximação à palavra poética.
Sophia, Jorge de Sena, Vitorino Nemésio, Pedro Tamen, Armando Silva Carvalho, Carlos Poças Falcão, Fernando Echevarría, Adília Lopes, Ruy Belo, Ruy Cinatti, José Bento, Cristovam Pavia, Daniel Faria: em algum momento das suas obras poéticas, cada um destes autores, vozes agora de novo escutadas ao anfiteatro da Escola de S.Pedro, confrontou-se com a questão de Deus. Para lhe dar assentimento, em alguns casos; para permanecer, eternamente, interrogação, em outros; ou, em definitivo, para se declararem, alguns, geracionalmente vencidos de uma dada pertença religioso-confessional. Não se cura, pois, aqui, de poemas de tipo catequético, arrumados à segurança e certezas sem mais.
Na indispensável e fraterna presença do grupo disciplinar de Português, bem como da Professora-Bibliotecária na sua hospitalidade acolhedora, em cada uma das mestras que “convocam para o significado” – papel do professor das Humanidades, segundo George Steiner – neste derradeiro ano do terceiro ciclo, ouvimos, com idêntica devoção, o modo como a Catarina Monteiro, o António Reis, a Joana Ramos, o Afonso Castro e a Carolina Soares puderam bem interpretar nomes maiores da poesia portuguesa contemporânea. E concluímos, com essa dádiva do antigo aluno que regressou, pródigo, a casa, na parábola que assinou e disse na primeira pessoa, poema sacado do bolso, com os refugiados caídos ao Mediterrâneo e a perplexidade de um Job frente ao mal que um Deus silente consentiria afinal, teodiceia, sempre ao largo, na pergunta pelo mal, nela mesmo, de quem o não naturaliza e, portanto, não aceita, e com ele continua, felizmente, a indignar-se - nessa mesma indignação, diria João Manuel Duque, desde logo, essa divina presença. Ou, muito poeticamente a encerrar a indagação, com Gottfried Benn:
Muitas vezes me tenho interrogado, mas sem encontrar resposta,
sobre de onde provém a doçura e a bondade.
Ainda hoje não o sei, e agora tenho de partir.

Pedro Miranda

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